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A maternidade abordada em tom humorístico, no meio do Atlântico, por um casal em que a experiência neste mesmo assunto é nula. O objectivo é relativizar o difícil e complicado e rir, rir muito...
Quando era criança havia três datas que me faziam riscar o calendário, eram três datas que me davam insónias na véspera de tão entusiamada.
As datas eram o meu aniversário, o Natal e as festas da Nossa Senhora dos Anjos.
As festas em pleno Agosto, em pleno mês de férias, mês de praia e sol eram de uma alegria imensa. A chegada dos aviões e dos carrinhos das "estacadas" eram a prova de que a festa ia mesmo mesmo começar e que alegria era vermos eles acampados em pleno pasto. Vê-los montarem o estaminé com uma destreza e rapidez, a mesma com que desmontavam em rumo à próxima festa de aldeia. De tempos a tempos havia o rumor de que os carrinhos não viriam naquele ano. Que dor, que angustia, festa sem "carrins" não era festa e quando os viam chegar, faziam a notícia voar em menos de dez minutos em cada casa da freguesia.
A próxima grande tarefa era colecionar o maior número de fichas e senhas para serem utilizadas em todos os dias da festa.
Tinhamos roupa nova, roupa nova para os três dias, mas antes já se tinha gasto litros e litros de lixívia a lavar a casa de cima abaixo, a arear todo o canto e soleira da casa. Casa que não era "escabelada", não era casa digna da festa.
À noite vai-se para a festa de calças para esconder os joelhos negros de tanta carpete lavada, dedos das mãos quase sem tocos de tanta palha de aço usada e muitas vezes, completamente, estouradas de tanta batata descascada e casa "escabelada".
Faz-se tabuleiros de carne assada, bebe-se muito vinho doce e muita fruta. Come-se que nem "leãs".
Tinhamos o ritual de ir comprar à praça fruta e loicinhas de barro na manhã do dia 15 de Agosto. Uvas e melancia da caloura eram as escolhidas, aquelas uvas que malham a roupa e que dão direito a puxão de orelha... Malhar a roupa da festa era estar, verdadeiramente, em maus lençóis.
À noite era pegar no dinheiro amealhado o ano inteiro e criar uma lista de prioridades.
Primeiro pipocas, depois algodão, depois ir à senhora das "arregolas" com o ajudante drag queen, depois ir à máquina que lê a mão, depois "aviãs", depois "carrins", depois tremoços, depois gelado na praça, depois bilhetes no bazar, depois ir levar a jarra ganha nos bilhetes do bazar à mãe e pedir dinheiro para um cachorro que ainda não se comeu nada hoje.
Enfim... Aquilo era uma azáfama, andávamos sempre em estado histérico e àvido para não perder nem um bocadinho do que a festa nos dava.
A festa era sinónimo de côr, de música, de pessoas alegres e bem dispostas, agora tenho um filho, agora é a minha vez de o mostrar a festa, de criar rituais e tradições, de o mostrar as carroças feitas à mão, dos galinhos de açúcar, das flores no chão, da verdadeira festa.
Este ano com muita pena nossa não fomos, um imprevisto estragou-nos os planos para o dia, mas para o ano ele poderá escolher a sua carroça. Entretanto, montei-lhe o arraial que eu não sou mulher de deixar passar uma festa em branco.
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